segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Rosto a Reboque

Cimento e ar
passeio arenoso e sujurbano
parece prazeroso chamar escombros de lar

Mas é terra de chances
apesar de infértil
e se torna impermeável à fluência do amor

Ação oportuna e promíscua é sim construir
e que o vazio fique sempre pra depois

Até explodir de tanto vagar esse espaço
e manchar de nada nossa cara somática
e total

Mas viva viver nesse lodo
e que o modo do mundo seja puro
cinzento
e fatal

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Ascendescer

Quando criança, subir em árvores, aranhar-me entre os umbrais e trepar em brinquedos metálicos eram maneiras de superar a pequeneza infantil, almejar alturas espirituais pelo meio físico, aspirar lembrar-me, lá em cima, da verdade ainda fresca numa memória tão vasta. Mas essa pequeneza cresceu, com o tempo e a experiência, e hoje não há arranha-céu, viagem aérea ou espacial que a vença - sou homem, como todos, que deseja ser mais do que é e se torna inferior ao que sente.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Sôfrego Dessignificado

A palavra se enche, se esvazia e se reenche de significado com grande velocidade e banalidade, até o momento em que é petrificada pelo pensamento estático, preguiçoso, embotado, cansado de nunca ser.

Na mesma medida, por exemplo, a cidade cresce e seu nome perde importância: você não pensa em Rio de Janeiro, mas em tudo o que sabe sobre o lugar que deu sentido à frase.

O mesmo acontece com o amor, infestado de nossos traumas e alegrias, portador dessa soberba horrível que temos ao achar conhecê-lo.

E assim é com o mundo, que violentamos a todo momento por taxá-lo negativamente sem sabê-lo, julgando-o meramente a partir de nossa curtíssima experiência nele.

Chega desse movimento gasto e revoltado que revoluciona a revolução, que reage à reação, que guerreia contra a guerra, que parou de perguntar porquês e passou a afirmá-los com raivosa convicção.

Chega de autocrítica hipócrita, que busca ferir o outro pela autoflagelação, quando "ai de mim" é "ai de vós", sendo sempre santa a lamúria e blasfema a redenção.

Quero anular essa distância abissal de observação dos fatos e perder por completo a habilidade de diferenciá-los de mim, de você, de nós e de tudo.

Quero redescobrir as coisas, não sem antes ver derreter delas esse manto ceroso de preconceitos e encontrar as palavras em momento de pré-concepção.

E que assim permaneçam, nunca ditas, numa sofreguidão alerta, nessa ânsia de palavra consciente dela mesma, estado único em que ela pode ser-se.

Esse é o poema que eu não escrevi, e nada superará sua beleza.

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Não sou ladrão de fotos, o crédito é deste rapaz, cuja página de fotos pode ser acessada clicando-se neste link ou sobre a imagem.

Enquanto eu não tomo vergonha na cara, baixe: AllanZi - Perdão (Rapidshare)

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Cadernices 2 - A Miríade do Imediato

Objeto da ação
afazer
objeção
abjeto

Empresa de esforço empreendido
só se aprende
a prender

E por que
ninguém pergunta
porque ninguém pergunta
por quê?

A miríade insentida de sentidos
sincera e sensata
inexata, descartada

E nessa vida inovada
o imperativo é automático
sem saída
e censura

Mas lhe parece óbvio
que me parece claro
que nos parece certo
que desaparecerá

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A partir do próximo post tomarei vergonha na cara e não mais farei links para o rapidshare. Vou criar uma conta no internet archive, e haverá outra maneira de acessar meus mp3. Por enquanto, esse é baixável
-> AllanZi - Corinthians.mp3 (Rapidshare)

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Perdedor

Eu escondo meus defeitos nas virtudes
e não nego ser por vezes perdedor

Mas desejo que se afirme entre os demais
e que seja o primeiro colocado

Eu desejo que suceda
condecorado ou promovido

Pouco importa quem melhor deseje
contanto que o bem seja seu

É o que faz com seu mal que preocupa
e não desejo esse medo a ninguém

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Imagem: William Adolphe Bouguereau (1825-1905) – Dante And Virgil In Hell (1850)