terça-feira, 21 de maio de 2013

Encontre o sujeito

O criminoso mata
a sociedade clama
o governo omite

O pobre rouba
o menor é cúmplice
a justiça é cega

O preto folga
o veado esnoba
a mulher que manda

O mercado exige
a gentalha grita
a arma cala

O Éden me chama
o inferno é dos outros
o dinheiro é meu

Onde está esse sujeito
que apontando
sem um verbo
nada faz?


O sujeito não se encontra
não se enxerga
não se vê

Representa-lhe o indeterminado
fica à mercê do oculto
e o simples que se dane
ou sujeite-se pra merecer

Antes fosse observador
está mais pra inexistente
mas presente no discurso
de um tempo virtual
e perigosamente
distante

sexta-feira, 10 de maio de 2013

Não é a mamãe


Ser pai é foda. Nos dois sentidos. Só é menos foda, em ambos, quando o cara insiste em imitar o pai que foi seu avô ou bisavô: provedor distante, incapaz de afeto, filhopata sentado à ponta da mesa de jantar ordenando que lhe "passem as batatas". No mais, ser pai, principalmente de um bebê, é muito foda, e não tem mais lugar praquele tipo de figura paterna arcaica, a que deu vulto ao execrável patriarcado – tiozão que não sabe trocar uma fralda. Hoje, a gente tem mesmo que se desdobrar para aprender um monte de coisas que ninguém fez questão de nos ensinar, já que tem muita mãe machista por aí que prepara os filhotes na escola da tirania. Não foi o meu caso, mas os ecos disso tão por aí, na novela, na propaganda, nos Felicianos do Brasil. Não vem ao caso.

Mas também não é o caso do extremo oposto. Juro que fiquei tentado a ser esse pai fofíssimo da leva new wave de pais que, desculpem, só existem nos contos de fada hipsters: querem ser mães, dizem-se quase mães, sentem-se como um bizarro protótipo de mãe sem peito para aleitar. Mas não são! Você tem a sua cotinha de dar conforto, de aliviar uma cólica ou outra, de fazer dormir um dia aqui, outro ali. São todas pequenas conquistas que nos fazem pensar: "Porra, sou foda!" Ser pai é foda, mas você não é, não. A mãe é. Esses momentos mágicos só vão rolar quando o pimpolho ou pimpolha estiver nas últimas forças, sem energia sequer pra fazer o que sabe melhor: dizer, com seu corpo, gestos e choro que "não é a mamãe". 

É, amigo, acostume-se, pois você não é mesmo! É pai! Eu me senti meio fora da brincadeira, que de brincadeira não tem nada, nos primeiros meses. Por mais que eu quisesse me mostrar ali, disposto, “vamo que vamo”, é a companheira que resolve a maioria dos perrengues diretos com o bichinho. Afinal, ele quer estar muito mais em contato com aquela deusa maravilhosa que o gerou, não com esse maluco peludo! Você vai fazer compressa e mamadeira no meio da noite, sim, vai correr pra comprar papinha no mercado, dar uns banhos catastróficos e fazer uns rolês impensáveis no decorrer do percurso. Mas aquele milagrinho berra pela sua progenitora, sempre!

E não me venham com essa de "pai grávido". Ainda que eu curta alguns posts do blog de um famoso pai X-Men, autor de um livro que descreve um pouco o conceito mencionado, não é assim que acontece na maioria dos casos. Pode ter um ou outro que passe mal durante a gravidez (da companheira), mas há grandes chances de ser só ansiedade. Eu passei mal de tanta dor nas costas, mas tenho certeza que a minha esposa teve muito mais disso do que eu.

Não tô aqui impedindo ninguém de ser fofo, só que isso vai soar meio falso, às vezes, não natural. Agora, ser carinhoso, terno e bondoso com o seu filho, não é opção, é obrigação! Mas é nesse momento que a gente aprende a não esperar nada em troca, já que, quando a chapa esquentar, o nenê quer é mamar. E não pense que esse lance de ser pai 2.0 (3.0? Onde estamos, mesmo, nessa contagem?), consciente do seu lugar na criação da cria, tem muitas regalias. Lembra que a gente abriu mão de ser aquele Darth Vader, em uma galáxia muito, muito distante? Pois bem, agora você tá sempre tão próximo que vai ouvir um monte se resolver tomar aquela cervejinha com "os caras" e passar um pouco da hora. Experimenta!

Acabei de ir lá fazer uma inalação no garoto. O Pedro tem 11 meses e só agora eu sinto que a nossa conexão tá começando a acontecer. Ele sorri quando eu chego em casa e gosta de me ouvir tocar violão, dançando, todo animado. As viradas de tempo são cruéis com os bebês e o peito dele tá com um gatinho miando de novo. Mas adivinha quem tava lá, fazendo ele dormir e dormindo junto, de tão cansada? A mamãe. A Thaís é a melhor companheira do mundo, é claro, e eu sou seu aprendiz na jornada que é o crescimento do Pedrinho. No fim das contas, você não é pai: vai se tornando, bem devagarinho, como um útero externo de onde se estende um novo cordão, invisível. Eu não tenho um útero de verdade, então, pro meu pequeno me conhecer por dentro, ele precisa que eu me mostre, assim mesmo, toscão, verdadeiro, do mesmo jeito que eu virei marido. Ser marido é foda. Mas esse já é outro papo.

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Allan Zaarour é jornalista, músico e blogueiro ocasional. Pai do Pedro e marido da Thaís, vai aprendendo com os tropeços e escrevendo sobre eles.