quarta-feira, 12 de setembro de 2007
Desinexistência da realirrealizacão: só a língua não trava
- Tsê vai?
- N'spermercado.
- Traispão?
- Ahã.
- Caboabanana t'mém.
- Tá.
- Sidé trais'ma coisinha gostosa.
- Ah, screviaí na lista, vai.
- Tá... Tó.
- Tá fui. Qué cois'liga n'celular.
Trabalhando hoje na revisão de um artigo sobre linguagem falada versus escrita, comecei a pensar sobre os mundos que habitamos criados por essas linguagens, e pela nossa própria língua, claro. Nosso universo é u jeit'c'magente fala. A depreciação desse oralismo em algumas línguas levou ao seu fim. Talvez não necessariamente por culpa do engesso formal da escrita, mas a possibilidade disso acontecer sempre existe. Poderíamos pensar que é essa nossa fala que acaba com uma língua, mas, longe disso, é ela que faz a língua mudar gradualmente, desenvolver-se, aprimorar-se, garantindo sua sobrevivência a cada volta que mundo dá. Dependesse da linguagem escrita, quem sabe ainda estivéssemos falando latim ou línguas ainda mais antigas.
Com freqüências variáveis e complexidades diferentes, também, inventamos muitas palavras durante a vida. Ainda que sejam onomatopáicas, limitem-se a arremedar sons, a gente precisa criar extensões desse mundo comunicativo, ramos que às vezes nos faltam. Isso mostra o quanto o desenvolvimento da língua está conectado ao da própria humanidade, com todas as suas necessidades criativas e produtivas (mais a última). Tal como no artigo, que não posso citar com precisão agora pois está amontoado lá sobre minha pseudo-mesa de frila-da-puta em Pinheiros, penso que a língua é uma parte intrínseca do mundo particular que cada um habita.
Quando ouvimos línguas africanas, asiáticas, de tribos específicas quase mortas ou mesmo as européias às quais não estamos habituados, sentimos estranheza e às vezes até desprezo, pois não as compreendemos. O mesmo acontece com regionalismos aqui no próprio Brasilzão. Grande parte dos concidadãos paulistanos que conheço tem reservas em relação a sotaques provindos do Nordeste e outros cantos, e antes o preconceito fosse apenas contra a variação lingüística usada. Em outras palavras, a maioria das pessoas tem medo do que não conhece, e em vez de tentar compreender o desconhecido, o diminui, o espezinha, tira sarro, para manter um afastamento seguro daquilo que não é próprio de seu mundinho. Mas é presumível que quem conhece mais variações do idioma possui, de fato, mais cultura, e conhecer todos os "portugueses" do Brasil não é tão "baiano" quanto alguns intolerantes (não vou usar outro nome feio em nome da ética temporária dessa blogação) gostariam que fosse, apesar de certas pessoas acharem que ter cultura é saber o que rola em Paris ou Nova Iorque.
Mesmo todos nós tendo preconceitos, temos preconceitos diferentes, que estão ligados a experiências pessoais, traumas, lembranças, conversas e pensamentos isolados, que vão construindo nossa personalidade. Assim, vivemos em dimensões absolutamente particulares, o que me leva a pensar que aquilo que tentamos entender por "realidade" não existe. Isso também chupinhei do artigo, mas tento ir um pouco além em exemplos toscos. Se o que é real é o objetivo, o que é visto ou palpável, se o azul é azul, que será o azul para um daltônico? O que será uma rua pavimentada para quem nunca a viu? A rua, que eu saiba, só tem esse nome em português... e mesmo que street seja o correspondente em inglês, essa palavra foi criada a partir de outros parâmetros. No mundo ocidental é comum que se ache bizarro colocar à prova o que já está gravado na parte feita de pedra em nossos cérebros. Não estaríamos, a todo momento, tentando impor diferentes realidades a todos, ou aceitando realidades pré-fabricadas com toda a passividade do mundo apenas para não termos de pensar sobre a nossa própria?
Isso é provavelmente a fórmula para guerras e qualquer vileza que se possa imaginar. Some à questão de realidades particulares alguns determinados líderes que pela força, pela "política" ou pela religião conseguem convencer milhões a seguirem sua própria visão de mundo, mais o desconhecimento e a não aceitação da realidade de outro país, sistema político ou crença, mais ainda certos interesses em riqueza financeira e poder em geral, pronto, temos qualquer conflito já ocorrido na breve história do ser humano sobre a Terra. Poder-se-ía dizer que animais também conflitam, mas não podemos nos esquecer que por razões infinitamente mais "objetivas" do que a utópica objetividade que pretendemos alcançar para viver em um mundo civilizado, prático, bonito, limpo, "em paz". Os territórios que o homem quer conquistar não existem, pois são realidades e pertencem ao próximo, ao próximo, ao próximo.
Se queremos ser gente, é bom que comecemos a entender que todo mundo quer, mas ninguém do mesmo jeito. Há solução para esse quase paradoxo inútil sobre o qual um blogueiro solitário se propôs a punhetar? É possível, mas antes precisa-se entender que a comunicação é mais do que a língua que falamos. Existe uma língua oculta que não precisa articular palavras nem expressar pensamentos, mas que permite à alma não se amargar perante outra e não se incomodar tanto com as diferenças. A única palavra que me vem à mente para expressá-la é "consciência". Mazagent'temq falá'amema língua, né?
Testando um novo birinaite, mp3. O tempo que fica disponível é curto, então baixem, caros não-leitores não-ouvintes. Em breve colocarei músicas minhas, cds inteiros, para todas essas milhões de pessoas que consultam o blog poderem fazer a festa. É uma múisca do Weather Report, chama Directions, do álbum Forecast e na verdade é uma tomada que nem foi para o disco originalmente. Quem quiser saber mais 'dáum gúgou', ou 'vêna uiquipédia'! (clica na imagem e depois, no rapidshare, clica em 'free')
jogada por
AllanZi
às
18:30
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movimento de
opening
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2 comentários:
Grande Zi... golaço de post!
As pessoas em vez de evoluírem seus sentidos e sua conciência à grandeza do novo, escolhem involuírem, se valendo de conceitos pré-FABRICADOS, diminuindo oque se é observado para caber dentro da sua insensível e pobre consciência.
E enquanto a consciência alheia for imaterial e não-lucrável (muito pelo contrário), reinam a imbecilisão, o jabádio e as revistendenciosas. Claro... reinam no mundinho.
Mundo mundo vasto mundo. Independente que como eu me chamar, e de como eu o chamar, o mundo continua mundo. E vasto!
Sobre o Weather Report, seguindo a linha de não-leitores e não-ouvintes, acho que você se referiu às milhões de pessoas que não lêem o blog e não às que lêem. m-huh m-huh
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